cândido
- Ana Carolina Albuquerque
- 14 de dez. de 2020
- 3 min de leitura
Atualizado: 14 de dez. de 2020
Acabei de ter o sonho mais vívido da minha vida, por favor não me belisque. Mesmo acordada ainda estou nele. Não consigo parar de pensar no momento em que meus pés deixaram de tocar o chão.
De fato, bater na cama e dormir instantaneamente sempre foi o meu forte. Esses dias, no entanto - ontem especificamente -, peguei-me criando memórias que nunca tive e lembrando de momentos que nunca vivi. Lembrei dela, aquela que deixei de conhecer há anos e nem sequer lembro da voz. (Não é bem assim, na realidade, mas para que serve uma escritora se não para exagerar as coisas? Continuando...) Senti um frio na barriga ao imaginar aquilo que nunca fomos e provavelmente não seremos.
Achei que dormiria e ficaria por isso - eu acordaria pela manhã e não pensaria mais nela. Para quê alimentar esperanças? Vidas reais não são como os sonhos. Mas isso não faz com que eu queira (re)vivê-los menos.
Dizem que os sonhos duram, em média, 25 minutos. Ontem, nos meus 25 minutos, meu nome foi Carolina. Só Carolina. Eu morava em Canterbury, mas isso não era definitivo. Era fácil me sentir em casa em qualquer lugar, para dizer a verdade. Por isso estava sempre em movimento. Meus empregos variavam entre garçonete, secretária e escritora - sempre encontrando espaço para surfar na praia mais próxima. Meus amigos eram tão espontâneos quanto eu - provavelmente aqueles que pais tradicionais chamariam de "não querem nada da vida" (embora eles não pudessem estar mais errados). Nós temos o resto de nossas vidas para ficar presos no politicamente correto, nas profissões que pagam melhor e na vida adulta. Por agora, queríamos aproveitar a vida de jovens (adultos). Será que é querer demais?
Acho que não sou tão ousada quanto Carolina. Como ela, claro, eu quero viver uma vida extraordinária. De fato, quero que cada momento - bom ou ruim - faça valer a pena todos os desafios que vou passar, não quero me arrepender de nada, nem me prender ao usual. Eu quero trabalhar para sustentar a menina sonhadora que existe dentro de mim, a menina que viaja o mundo através da imaginação; aquela que tem três empregos, um cartão de trem e incontáveis cidades para explorar. Quero mesmo. Mas a vida real grita muito alto e eu nunca deixo de ouvir.
Pergunto-me novamente se é querer demais pedir aos céus por essa vida idealizada que tenho quando sonho. Não são os sonhos a nossa parte mais sincera? Quando deixamos os "mas" e os "e se" para realmente ir atrás do que queremos? Às vezes o que falta é dar mais crédito ao nosso subconsciente, reconhecer que é nele onde se encontram nossos desejos mais profundos e, honestamente, assustadores.
— pausa para uma reflexão fajuta —
Como conciliar o instinto racional com o desejo sonhador? Seria como o céu encontrando os pés no chão.
— voltando à programação normal —
De qualquer forma, não acho que seja tão fácil assim. Acabei de escrever mais de 400 palavras sobre sonhar e ainda assim não me convenci de nada que falei. Acho que sou a pessoa mais hipócrita que eu conheço: vivo pregando a liberdade, independência, o instinto, pelo amor de Deus! - mas na primeira oportunidade que tenho de seguir meu coração eu boto o pé no freio e escolho a saída racional. E pior, como forma de aliviar minha consciência e não criar arrependimentos, fico cultivando pensamentos como: "Se a vida fosse dessa forma não teria graça, teria? Parando para pensar, existe uma beleza louca no tapa na cara que a vida nos dá - não adianta ficar preso em contos de fadas e clichês".
Fala sério, tudo parece uma piada de mau gosto: no século da informação, cinema e tecnologia - onde a disseminação do ideal e perfeito são consumidos diariamente sem limitações -, aquilo do que você mais se alimenta está cada vez mais longe de ser o suficiente para te sustentar.
Mesmo eu sendo estupidamente racional, ainda prefiro acreditar que meu dia vai chegar. Talvez eu encontre a minha Carolina interior quando eu menos esperar e tudo vai ter valido a pena.
Até lá, pelo visto o que me resta é sonhar.
Ana Carolina Albuquerque





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