Aninha do vestido vermelho
- Ana Carolina Albuquerque
- 16 de ago. de 2020
- 3 min de leitura
Atualizado: 1 de out. de 2020
– Filho, senta aqui com a mamãe – dou duas batidinha no sofá, esperando que meu pequeno se junte a mim. – Mamãe vai te contar mais uma história da Aninha.
Solto uma risada quando vejo a miniatura do pai correndo como um furacão em minha direção. Todo desengonçado, esse meu neném.
– Conta, mamãe, conta! – sinto a troca de calor quando nossos corpos se tocam e o puxo pra mais perto de mim. Esse aconchego eu não troco por nada.
"Era uma vez, há muuito tempo atrás, uma cidadezinha no interior de um lugar bem longe daqui. Nessa cidade, existia uma família muito unida. Muito unida e muito grande! Vários primos e primas, irmãos e irmãs, vovôs e vovós para tudo quanto era lado. Todo mundo era da família de todo mundo.
Essa família se encontrava todo domingo na casa do Vô. O Vô tinha vários netinhos e netinhas, e ele amava todos eles muito. Pedia pro papai do céu dar muitos beijos neles todos os dias antes de ir dormir. A Aninha era uma dessas netinhas. Ela amava o Vô. Adorava ir na casa dele e brincar com os primos e primas."
– Eles brincavam de pique pega? E esconde-esconde? Papai nunca me acha no esconde-esconde – solta uma risadinha marota.
– Sim, meu amor, brincavam muito de pique pega. Verdade... você fica invisível quando jogamos esconde-esconde, que nem a Mulher Invisível daquele filme dos super-heróis que você gosta, lembra? – faço carinho em seu cabelo.
"Todo domingo tinha uma competiçãozinha entre os primos pra saber quem tinha a melhor nota na escola, a roupa mais bonita ou quem dava mais piruetas sem ficar tontinho e cair. A Mãe da Aninha costurava os vestidos mais lindos que você possa imaginar. E em um certo dia, a Aninha foi pra casa do Vô com um vestido vermelho de bolinha, o favorito da mãe dela. Fecha os seus olhos e pensa em uma menininha com o vestido vermelho de bolinhas mais lindo que você já viu. Isso, bota a mãozinha na frente do olho. A Mãe pediu várias vezes pra Aninha tomar cuidado pra não sujar o vestido, porque sabia que ela era sapequinha. Que nem você! Dois sapecas. Naquele dia, Aninha brincou muito na rua e conheceu um amigo que acabou sujando o vestido dela de lama sem querer."
–E agora, mamãe?
"A Aninha se meteu em uma furada, ficou de castigo por não ter tomado cuidado. Mas aquele foi um dia muito legal pra família dela e a Mãe depois logo esqueceu do vestido sujo. Naquele mesmo dia, colocaram asfalto na rua da casa do Vô. Asfalto é onde você pisa quando sai na rua pra ir no parquinho, sabe? A rua do Vô foi a primeira rua da cidade a ter asfalto, antes era tudo terra. A família dela queria muito que colocassem asfalto na rua, seria uma mudança muito grande pro pessoal que morava lá.
Quando a rua ficasse pronta, Aninha ia poder brincar o quanto quisesse que o vestidinho dela não ia sujar de terra mais."
O som de chaves me impede de continuar a história e logo a porta da sala se abre e uma velha face aparece para nos fazer uma visita. Meu pequeno sai correndo em seu encontro, louco por um abraço que só ela sabe dar.
–Bisa Ana, bisa Ana, posso ver o seu vestido vermelho? Quero um igualzinho pra dar pra minha irmã.
Vovó Ana se surpreende com o pequeno furacão que a atinge e ri contente. Antes de responder qualquer coisa, ela o abraça e, em meio a esse apego, sorri e olha pra mim com aquele olhar maroto - talvez o mesmo olhar maroto que ela tinha quando criança, que nunca realmente deixou de existir - que falava tudo sem precisar dizer nada.





Eu acho que conheço essa Aninha...😍